No Brasil, a chuva que mata os pobres cai sempre que pode

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As intensas chuvas no sul da Bahia durante os últimos meses de 2021 já anunciavam mais este terror socioambiental brasileiro que temos visto em curso: fevereiro de 2022 ainda nem tinha acabado e já eram centenas de vítimas fatais e outras dezenas de milhares desabrigadas nos estados da Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Com impactos bem menos gráficos e comoventes do que as catástrofes associadas às chuvas nesses estados, a profunda seca por que passa a região sul do país, em especial o estado do Rio Grande do Sul, é outra alarmante crise que evidencia a vulnerabilidade do povo brasileiro perante os imprevisíveis fenômenos naturais.

Socioambiental, sim

Estamos acostumados com as tragédias periódicas causadas pelas chuvas no Brasil. Todo ano, no verão, acompanhamos as notícias de alagamentos e deslizamentos que matam os brasileiros e destroem suas casas. Essas tragédias são prontamente justificadas pela grande mídia: chuvas para além do previsto, Zona de Convergência do Atlântico Sul, aquecimento global — este último, quando citado, sempre em níveis de abstração e distanciamento elevados, maquiado de fenômeno sobre o qual nada pode ser feito. Uma catástrofe, uma pena, e vida que segue. A mobilização popular cabível, nesse caso, se restringe à ajuda humanitária imediatista aos atingidos.

A narrativa construída pelo aparato midiático burguês sobre esses acontecimentos busca tirar nossa agência, enquanto povo, diante de problemas que são, sim, de caráter político-social, e que só podem ser resolvidos quando percebidos e tratados como tal.

Enquanto é verdade que não se controla as chuvas, é também verdade que:

  1. O aquecimento global, acentuado como nunca, é uma consequência do sistema de produção capitalista, que atende única e exclusivamente os interesses da classe dominante — a burguesia. Para se fazer viável, mesmo que temporariamente, o capitalismo se fundamenta no distanciamento entre o homem e natureza, em que esta é percebida e tratada como uma fonte de recursos a ser explorada até a extinção em prol do avanço da civilização (leia-se: o avanço do acúmulo de capital nas mãos da burguesia).
  2. As pessoas são tão mais afetadas pelas tragédias ambientais quanto mais marginalizadas socialmente elas são. Quem são as vítimas das tragédias no sul da Bahia? A que ponto a situação no estado nordestino teve de chegar para receber atenção? Quem são as pessoas que, por não terem o direito à habitação digna e segura garantido, moram em áreas de alto risco e sem estrutura? Tais tragédias acontecem recorrentemente em regiões ditas “nobres”? E são tratadas com tanto cinismo quando acontecem? A burguesia precisa se expor diariamente a situações de alto risco para viver? O perfil histórico das vítimas é muito claro, e as tragédias recentes confirmam isso mais uma vez: são trabalhadoras, em sua maioria racializadas e de baixíssima renda.

As chuvas, por mais que incontroláveis, não precisam castigar e nem matar tantos trabalhadores brasileiros. Quem dá essa sentença não é o meio ambiente.

Saída pela luta ecossocialista

Os problemas socioambientais têm bases sólidas e profundas no capitalismo. Em outras palavras, não existe capitalismo — sob máscara alguma — sem o avanço da destruição ambiental. E o preço dessa relação predatória é distribuído injustamente, pois é a classe trabalhadora, já tão explorada, que arca com as terríveis consequências dos atos burgueses.

A solução destes problemas, portanto, não virá do capitalismo e nem de quem lucra com ele. Apenas o povo auto-organizado no poder é que pode gerir uma sociedade de acordo com seus próprios interesses, sem divisão de classes e nem acúmulo de capital. É necessária a construção de uma sociedade ecossocialista, onde o povo se reconheça parte do mundo em que vive e entenda que sua real prosperidade depende de uma relação harmoniosa entre si e com os demais elementos desse sistema. 

São urgentes as mudanças sociais radicais. Não podemos mais sustentar ideais consumistas e nem modelos produtivistas e extrativistas. É inaceitável que o povo não tenha pleno acesso à habitação segura. É intolerável que a burguesia exista e siga impondo desgraças sem fim sobre nós em prol de seu enriquecimento. E cabe a nós — a classe trabalhadora — deixar de tolerar. A luta ecossocialista é nossa.

*Texto: Frederico Santiago (Ecoar MG), Larissa Helena (Ecoar PR) e Mateus de Albuquerque (Ecoar PR).

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