PORQUE ORGANIZAÇÕES REVOLUCIONÁRIAS DISPUTAM AS ELEIÇÕES?

Esse texto se faz necessário em mais um período eleitoral da máquina estatal burguesa. Período este que, infelizmente, a esquerda concentra-se em dois polos. O primeiro, mergulha e deleita-se com as falsas promessas da política burguesa. Aprisiona-se nas limitações intrínsecas da estrutura estatal e transforma a organização de classes em uma mera forma de acessar as migalhas que são deixadas para nós. No outro, uma esquerda que se recusa a entender o próprio poço no qual estamos afundados. Que ignora que por mais que o Estado seja apenas o balcão de negócios da burguesia¹, ele o faz com armas, com a capacidade de alterar o preço da comida e o acesso à água. Não é dos balcões mais inofensivos que estamos falando.

O Ecoar, entendendo-se enquanto uma organização de juventude ecossocialista, revolucionária, amparada no marxismo crítico e na tradição da IV Internacional, busca superar essas visões que pouco tem a nos ensinar. Almejamos ser uma juventude que não foge à luta, que se lança nas apostas necessárias para o nosso tempo, mas sem ignorar as necessidades materiais do nosso dia-a-dia, rumo à construção de um programa de transição ecossocialista para a revolução brasileira.

Para tal, precisamos entender profundamente os nossos inimigos e nossas formas de luta, para não cairmos em auto engano. Buscando responder a pergunta que dá nome a este texto, expomos a seguinte síntese de importantes debates do marxismo revolucionário:

1) O Estado burguês é baseado em um conjunto de ordenamentos, instituições e estruturas que têm como função assegurar as “regras do jogo” para a manutenção do capitalismo. Ele não é neutro, embora se apresente como tal, e não pode ter sua essência alterada com uma simples vitória eleitoral. Nas palavras de Marx: 

o proletariado não pode, como fizeram as classes dominantes e suas diferentes frações rivais nos sucessivos momentos de seu triunfo, simplesmente se apossar desse corpo estatal existente e empregar esse aparato pronto para seu próprio objetivo. A primeira condição para a manutenção do poder político é transformar a maquinaria estatal e destruí-la – um instrumento de domínio de classe.²

Nos casos em que a classe trabalhadora está perto de conseguir vitórias  substantivas e estruturais dentro da institucionalidade que ameacem os interesses gerais das classes dominantes, estas usarão seus instrumentos e tecnologias para inviabilizar essas vitórias podendo, inclusive, romper com a institucionalidade através de golpes,  perpetuando a manutenção de seus exércitos, seu controle territorial e acordos imperialistas³. O Estado, “com seus onipresentes e complicados órgãos militares, burocráticos, clericais e judiciários, constringe (estrangula) a sociedade viva tal qual uma jiboia”. Essa é sua função.

2) Definitivamente isso não deve significar que não existem possibilidades de luta pelos espaços que possuímos no Estado, como em eleições, sindicatos ou outros órgãos representativos. Contudo, não podemos em nenhum momento esperar uma inflexão no estado de coisas das relações sociais, que o Estado é 

uma organização da classe capitalista dominante. Sem dúvida que assume funções de interesse geral no desenvolvimento social; mas somente na medida em que o interesse geral e o desenvolvimento social coincidam com os interesses da classe dominante.⁵

Portanto, nós, marxistas revolucionáries, entendemos que nossas disputas por reformas sociais estão atreladas necessariamente dentro de um contexto específico de ação política motivada em uma relação tático-estratégica, ou seja, nós lutamos por reformas sociais não porque essas alteram a estrutura da sociedade, mas sim pela sua capacidade de acumular forças, convencer pessoas, mobilizar setores para conquistar mudanças estruturais e criar situações materiais menos degradantes para as classes trabalhadoras. Entende-se por estratégia, de forma simplificada, o caminho que decidimos coletivamente seguir para atingir nosso objetivo maior e as táticas são as ferramentas que usaremos dentro da estratégia para alcançá-la, ou seja, nossa atuação na realidade colocada no dia a dia de nossa luta, que tem em vista a nossa estratégia. Logo, nas palavras de Rosa de Luxemburgo:

A reforma legal e a revolução não são métodos diferentes do progresso histórico que se possam escolher à vontade como se se escolhessem salsichas ou carnes frias para almoçar, mas fatores diferentes da evolução da sociedade classista, que se condicionam e completam reciprocamente, excluindo-se, como, por exemplo, o polo Norte e o polo Sul, a burguesia e o proletariado.⁶

Não deve existir, para nós, reforma social desatrelada da revolução. Em um nível de análise mais amplo, quando estendemos no tempo e no espaço, nossas estratégia eleitorais são sempre táticas, por estarem necessariamente atreladas de forma hierarquicamente inferior às nossas estratégias revolucionárias de tomada de poder. Especialmente as tradicionalmente reconhecidas: greves de massas e guerras populares. Ou seja, nossa atuação nas eleições configuram a nossa tática eleitoral, uma vez que representam a nossa mediação com a realidade colocada e, embora não possam, na nossa concepção, ser a nossa estratégia, só será uma tática eficaz se funcionar a favor da nossa estratégia.

Portanto, nossas táticas eleitorais devem pensar em acúmulo de forças para a construção dessas estratégias, caso contrário, deixam de ser táticas, tornam-se a própria estratégia da organização. Disputamos eleições não porque enxergamos na ocupação de cargos públicos o nosso objetivo final, mas para ter ganhos que nos possibilitarão, enquanto tática, a estar mais perto de nossa estratégia revolucionária. 

Concluímos que, organizações revolucionárias disputam eleições para conseguir ganhos mínimos materiais para as classes trabalhadoras, já que “não é a barbárie, mas o fortalecimento da classe consciente, com condições materiais para sua existência em múltiplas dimensões, que proporciona o acirrar da luta de classes”. Da mesma forma, entendemos a completa limitação de avanços substanciais por meio das eleições. Decidimos então apostar em candidaturas que ousem um pouco mais, em construções que se comprometam em alicerçar os movimentos sociais. Em aproveitar espaços de efervescência política para convencer as pessoas da necessidade de transformação, da urgência das mudanças climáticas e do ecossocialismo.

Você que também acredita que as eleições são importantes, mas que não se encerram em si mesmas. 

Que quer apostar no fortalecimento da organização dos debaixo, contra os poderosos. 

Que está preocupade com as mudanças climáticas e seus efeitos em nossas vidas. 

Vem com a gente, organizar a juventude contra o fim do mundo, criar dia após dia condições mais favoráveis para a revolução ecossocialista que necessitamos em nosso país, na América Latina e no mundo todo.

  1. MARX, Karl.O 18 de brumário de Luís Bonaparte.São Paulo: Boitempo, 2011.
  2.  MARX, Karl. A guerra civil na França. Trad. Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2011.
  3. Vide absolutamente todas as vezes que uma esquerda consegue uma vitória eleitoral e ameaça qualquer uma das garantias de manutenção de poder das classes dominantes.
  4. MARX, Karl. A guerra civil na França. Trad. Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2011.
  5. LUXEMBURGO, Rosa de. Reforma ou Revolução. São Paulo: expressão popular, 1999.
  6. LUXEMBURGO, Rosa de. Reforma ou Revolução. São Paulo: expressão popular, 1999.

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